...vai, mais rápido, apoteose da civilização.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Discursos e suas repercussões

Chegou o momento de voltar a escrever. Enquanto não recupero o fio da meada, preencho esse pequeno espaço virtual com um trabalho do ano passado, época na qual a universidade preenchia minha atenção.



A base do discurso articulado reside na população. A partir da coleta de diversas fontes, um autor lapida um assunto e elabora uma teoria, devolvendo-a após para o seu meio original. Essa transição de um discurso ingênuo, popular, para um discurso formalizado e, logo em seguida, seu retorno à sociedade, pode ser abordada e exemplificada de diversas formas.
O fato de uma pessoa possuir a sensibilidade necessária para abstrair da sociedade algum aspecto relevante a estudos não o faz necessariamente mais inteligente que o resto da população. A palavra certa para definir a qualidade deste indivíduo talvez seja perspicácia. Na verdade, aquilo abstraído já fazia parte da consciência de alguma parcela da sociedade. Ao captar aquele assunto, comum a alguns e novidade a outros, o autor apenas formaliza tal idéia. Esse processo de apuração, desenvolvimento e devolução à sociedade é caracterizado como a legitimação do discurso, o aval do qual a parcela da população que desconhecia um aspecto em particular necessitava para conhecê-lo e, assim, aceitá-lo ou não.
É possível exemplificar tal acontecimento a partir das propagandas políticas que ocorrem de 2 em 2 anos aqui no Brasil. Muitas pessoas não se simpatizam com as idéias e propostas de José Serra, por exemplo. A partir da inclusão da atriz global Regina Duarte durante o tempo de Serra na televisão, no entanto, a situação tende a mudar. A atriz exercita o discurso pró-Serra e anti-Lula, defendendo o candidato do PSDB e acusando o do PT, além de proferir a célebre frase "eu tenho medo", referindo-se a um possível destino apocalíptico que o país enfrentaria caso Serra não fosse eleito. Essa aparição da atriz, dona de respeito perante a sociedade, legitima o discurso pró-Serra, possivelmente trazendo mais eleitores para seu lado. É como um selo do Inmetro, assegurando que aquele produto pode ser utilizado por crianças pequenas sem problema algum. Isso demonstra a possível manutenção da opinião popular por meio de figuras carimbadas, sejam elas do mundo artístico ou de qualquer outro universo de grande apelo.
Outro bom exemplo deste movimento de ir e vir do discurso é o próprio hype. O hype se caracteriza pela vanguarda da moda, a origem de uma tendência que ao fim de um processo irá se popularizar. É comum enxergarmos diversas novidades pouco exploradas envolvendo vestimentas, acessórios, tendências musicais, etc. Assim sendo, tomemos como exemplo um hipotético falatório sobre o uso de tênis rosa em Tóquio, no Japão. Um grupo de artistas passa a usar calçados dessa cor pois ela transmite um dos diversos aspectos de seus trabalhos. Os fãs desse grupo, como todo bom fã, tendem a imitar seus ídolos, e também começam a usar o tal do tênis rosa. Ainda assim, uma parcela ínfima da populaçao tem conhecimento desse burburinho. Em um outro dia, a Nike toma ciência dessa tendência e, no mês seguinte, lança uma campanha publicitária com o seguinte mote: "Nike Pink 2000, apenas use". A partir disso, o hype do tênis rosa passa a ser uma moda, agora representada por um órgão legitimador de opiniões, no caso a Nike.
Não obstante, é possível falar também de inúmeros movimentos sócio-culturais e seus desdobramentos. Vemos cada vez mais alguns autores considerados subversivos e atípicos, que causavam estranheza à maioria da população, sendo massificados e absorvidos pelo senso comum, como são os casos de Charlie Bukowski e Nelson Rodrigues. O punk e o emo também são bons exemplos de como um movimento/tendência pode alcançar proporções inimagináveis. Sendo o punk a princípio um movimento social com repercussão musical, é possível dizer que ele teve seu ideal diluído em prol da manutenção de uma estética: o moicano, o jeans rasgado, a atitude "do it yourself". Já o emo, um estilo musical derivado do hardcore, foi massificado e associado à pessoas com franjas no rosto, à choro pelos cantos e à toda uma vestimenta padrão. Esses são casos em que há a apuração de um acontecimento, o desenvolvimento de toda uma idéia em cima dele e, então, sua devolução para o lugar da onde veio, com toda essa carga massificante por detrás. Cabe então aos poucos que já tinham ciência de tais nichos, defenderem sua autenticidade perante essa onda de diluições e deturpações, mantendo ao menos uma parcela do que aquilo já foi um dia.

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