...vai, mais rápido, apoteose da civilização.

domingo, 15 de abril de 2007

Crash

Eu, sempre mancando da vida, uma perna mais curta do que a outra. Mais uma vez me deparei com o quão posso, sempre que possível, ser essencialmente obtuso em minhas ações. Sabe quando você está indisposto a dançar e confraternizar uma música que não gosta, com pessoas estranhas te cercando por todos os lados, em um ambiente muitas vezes desconfortável? Hoje esse paradigma alcançou um nível curioso, quiçá intrigante. Estava lá eu, sendo requisitado a parar de chamar atenção negativa devido a meu persistente tédio, encostado no pilar enquanto todos quebravam as cadeiras. Dei início então, ainda relutando, ao meu Jam de dança, sem esperar coisa alguma do meu procedimento, afinal, ele nunca havia resultado em nenhum tipo de sucesso pós-moderno. Quando presto atenção, haviam alguns minutos já a música tinha acabado. A princípio este fato não me intrigou. Mero detalhe. A questão era que eu não havia parado. Persistia em meu um-pra-lá-um-pra-cá com absurda coragem. Era o único a fazê-lo no salão. Todos esperando a próxima canção, não eu! A intensidade de meus movimentos me comovia, de uma naturalidade fabulosa! Não havia ninguém, literalmente, que poderia se equiparar ao meu momento de transcendência, superando a gafieira, o maracatu, o funk e o electro. Oh Bruno, you give me heartattacks!

sexta-feira, 6 de abril de 2007

Mea culpa!

Protótipo de noite na obtusa zona noroeste da cidade de São Paulo. O trânsito é constante pois a população possui uma queda por voltar às suas casas. Burocraticamente, uma avenida qualquer curte a movimentação ao longo de sua extensão. Jogadores semi-profissionais se dirigem ao campinho de areia. O pagode ecoa por todo o quarteirão enquanto missionários evangélicos da igreja quadrada-elíptica-semi-circular se preparam para mais uma celebração ao príncipe da paz. O clima está agradável e não há muitos ônibus circulando para maltratar ainda mais os calos e crateras da já tão danificada cútis negra rodoviária. Uma bifurcação adiante desconhece a notável palestra de dramaturgia que iria observar em instantes.
Dois automóveis, trafegando junto ao fluxo, se estranham antes mesmo de se conhecerem. O trânsito se interrompe e o silêncio é ostracizado com o surgimento de inúmeras buzinas. Um conglomerado de pedestres foca sua atenção no espetáculo. Ambos os veículos ignoram qualquer resquício de cordialidade ainda presente no cotidiano e se encaram fervorosamente, rosnando um para o outro. Há ameaças de movimento inconcluídas. A inércia se rompe com advento de uma senhora, motorista de um dos carros. Ela dá inicio a um expansivo discurso sobre culpa e intenção, em plena via, gesticulando com eloquência. A platéia está confusa, a origem do desentendimento ainda é uma incógnita, mas quem se importa, "Queremos ver sangue". Porém, é do outro carro que brota o possível messias deste impasse, um rapaz de óculos sustentando uma espécie de pé-de-cabra em suas mãos. Que virilidade! O homem analisa a integridade de seu veículo minuciosamente e dispara um olhar mortífero contra sua algoz. Assustada, ela recua em prol de sua segurança. O outro, ainda sustentando uma postura ofensiva porém pouco messiânica, também retorna à seu automóvel. Os espectadores se desapontam.
Mas, logo em seguida, uma nova crise se instaura. Quem iria mover seu veículo primeiro? Não seria possível decidir isso simplesmente ignorando seu orgulho. O rapaz, ainda munido de seu artefato de estimação, volta a descer do carro. Mãos na cintura, inconformismo em seu olhar. "Não tem nada nos carros, sai logo daí mulher". Os motores voltam a rosnar incessantemente e há uma nova esperança de confusão. Nada acontece. A senhora continua maldizendo seus antagonistas. Já farto desta situação, surpreendentemente, o outro motorista abandona o volante de seu veículo e parte rapidamente contra sua arquiinimiga. Incorporando uma fúria medieval, despeja violentos golpes contra o capô opositor, sacolejando a si e à toda estrutura do automóvel. Não há uma razão nítida para a ação. Seu rosto avermelha-se, "Se não tinha nada amassado agora tem". Homem versus máquina em sua forma mais primata. Rapidamente, retorna à sua carroagem de ferro junto de seu companheiro de óculos, e dispara em alta velocidade rumo à salvação. Assim, a humanidade celebra a chegada do feriado em grande estilo.



Tenho que aprimorar um pouco este relato mas putz, mais um passeio noturno que rende uma história bizarra. Vou começar a sair todo dia por aí para retratar, quem sabe, possíveis retornos mais diretos à Idade Média. Era tão mais fácil resolver os problemas naquela época né? Viva los hombres!